Nascido no dia cinco de junho de 1863, na fazenda Boa Vista, município de Ipu (CE), filho natural do cearense Delmiro Porfírio de Farias e da pernambucana Leonila Flora da Cruz Gouveia, Delmiro Gouveia Farias da Cruz tem lugar destacado na história do empreendedorismo brasileiro devido luta incansável em prol do desenvolvimento regional, tendo buscado de todas as formas possíveis e imagináveis dotar o nordeste de dinâmico setor produtivo através do qual houvesse ênfase às transformações necessárias ao implemento da melhoria da qualidade de vida da população, bem como à dinâmica referente ao desempenho da economia estrangulada por práticas anacrônicas e obsoletas.
Homem de modos austeros, intercalava de forma singular passado e presente, modernidade e tradição, sendo responsável por extraordinária experiência de industrialização em pleno semiárido alagoano, dominado na época por beatos e cangaceiros, quando dos marcantes anos da turbulenta década de dez do século XX.
Era conhecido como o "rei das peles", pois fixado no ramo de couros, fundou em 1896 a Casa Delmiro Gouveia & Cia., realizando importantes transações econômico-financeiras com a poderosa casa nova-iorquina J. H. Rossbach & Brothers, de cuja utilidade em sua vida empresarial foi imprescindível e incalculável. Nesta época, passou a alijar os concorrentes do mercado, absorvendo os melhores empregados especializados, a exemplo de Lionelo Iona, John Krause, Guido Ferrari e Luís Bahia.
Perseguido tenazmente por poderosos inimigos em Pernambuco, os quais não viam com bons olhos a concretização de suas ideias populares, a exemplo da efetivação de empreendimento mercantil na capital pernambucana, o qual oferecia bens e serviços a preços baixos ao povo, sendo, portanto, alvo de incêndio criminoso, Delmiro Gouveia refugiou-se, no ano de 1903, na remota Vila da Pedra (hoje cidade de Delmiro Gouveia - AL), no sertão das Alagoas, a qual contava, quando de sua chegada, com apenas seis casa, localizada a 250 km de Maceió. Separado de sua primeira esposa, de nome Anunciada Cândida de Melo Falcão, havia raptado jovem que atendia pelo nome de Carmela Eulina, filha natural de Sigismundo Gonçalves, governador pernambucano.
No ano de 1909, Delmiro Gouveia iniciou estudos para a utilização econômica da cachoeira de Paulo Afonso, no rio São Francisco, sendo que em vinte e seis de janeiro de 1913 captou energia hidroelétrica na queda do Angiquinho. Começavam a se concretizar as condições necessárias para efetivar o pragmatismo do seu grande sonho.
No ano seguinte, aproveitando-se do abalo provocado pela primeira guerra mundial, quando os alemães, logo no início, prostraram o império inglês, com a genialidade de sua terrível máquina mortífera, Delmiro Gouveia inaugurou fábrica de linhas em pleno semiárido nordestino, inovando em razão da forma como implementava relações sociais de produção, conquistas sociais e de mercado, bem como ênfase à preservação ambiental.
O empreendimento industrial capitaneado por Delmiro Gouveia tinha a marca nacional Estrela, conseguindo, graças ao alijamento da concorrência inglesa, devido ao conflito mundial, adentrar mercados sul-americanos, como os da Argentina, do Peru e do Equador, com a marca Barrilejo.
A abertura de estradas também se constituiu em preocupação para o louvado cearense, notável empreendedor que ousou industrializar o mais pobre espaço geográfico brasileiro. Delmiro Gouveia foi responsável pela ênfase á abertura de cerca de 520 km de estradas, introduzindo ainda o automóvel no sertão.
No dia 10 de outubro de 1917, o industrial era assassinado em seu bangalô na Vila da Pedra. Tiros assassinos disparados na calada da noite buscavam desmantelar a mais excepcional experiência de industrialização que o semiárido protagonizou.
Símbolo de uma época, Delmiro Gouveia traduziu a luta desesperada de um povo em busca de melhores dias, tendo acreditado e concretizado a possibilidade de transformar arcaicas estruturas que ainda perduram fazendo com que a região nordeste do Brasil se singularizasse pela inserção plena em estratos que atestam as desigualdades que se recrudescem acintosamente enquanto marca cruel dos contrastes de nossa diferenciada espacialização.
(*) Geógrafo (UFPB). Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Campus Central, Mossoró/RN. Especialista em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (III CEOARQ /UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UERN). Contato: romero.cardoso@gmail.com
domingo, 21 de novembro de 2010
O Sonho De Industrializar o Semiárido
José Romero Araújo Cardoso (*)
Usina Angiquinho (foto de Valéria Amaral)
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